Várias trapalhadas ocorreram ao longo das produções dos filmes do Superman. Até parece sina do herói essas confusões que acontecerem nos bastidores de seus filmes. A primeira trapalhada veio logo nos dois primeiros, que foram marcados pela demissão súbita do diretor Richard Donner, que depois do sucesso do primeiro filme, não pôde terminar o segundo por causa das diversas brigas e desentendimentos que ocorreram entre direção e produção, sendo assim substituído por Richard Lester, que nem de longe tem o mesmo talento dele, mas conseguiu terminar Superman II, aos trancos e barrancos, e acabou assumindo a direção do Superman III. Depois, no Superman IV, a trapalhada ocorreu porque a Warner não estava mais interessada em investir na série, deixando o filme ser realizado pela paupérrima produtora Cannon Group Inc., que fez um filme típico dela, ou seja, totalmente pobre em todos os sentidos, efeitos especiais, roteiro e etc, resultando no enterro definitivo da série naquele momento. O ator Christopher Reeve até tentou bater de porta em porta, procurando alguém que quisesse bancar um Superman V, mas acabou não obtendo êxito. Já aqui, com os produtores reativando a série depois de quase 20 anos, para variar, outra trapalhada acontece: O diretor Bryan Singer estava envolvido até o pescoço com os filmes dos X-Men, mas abandonou tudo para fazer realizar essa nova seqüência para a saga de Superman. Com isso, quase que ambas as franquias vão para o lixo. Essa aqui do Superman passou muito perto disso. A sorte dela é mais devido a fama do herói, que é um dos mais conhecidos das HQs, e que tem um enorme público que quer continuar vendo as aventuras dele no cinema, do que propriamente nesse Superman – O Retorno que Singer “criou”.
Arrisco dizer que esse é um dos filmes mais “sem cara” que existe. É dirigido sim, pelo Bryan Singer, que mostrou competência no gênero nos dois primeiros filmes dos X-Men, mas aqui ele se anula totalmente porque sendo um fã alienado dos dois filmes de Richard Donner (colocando no plural, já que muita coisa do Superman II foi dirigida por ele), em vez de ir ao que achava melhor, preferiu ficar perdendo tempo em cima de detalhes que Donner colocou nos primeiros filmes, fazendo com que tudo não pareça nem coisa própria do Singer, nem consiga lembrar algo que o Donner tenha feito. O problema maior surge quando o diretor resolve fazer uma continuação dos filmes anteriores, mas se focando mais nos dois primeiros, sem considerar nem o terceiro ou o quarto. Até aí, tudo bem, só que ele se prende demais nesses filmes, e não neles em si, mas em todo esse conceito que ele, Singer, tem em relação ao Superman I e II, fazendo questão de se apoiar em detalhes, principalmente no que diz respeito ao romance de Lois e Superman, que só serviu para confundir aqueles que não conheciam os filmes anteriores, e para aqueles que conheciam ficarem estranhando tudo, já que a visão do Singer em relação a esses filmes é algo muito próprio dele e em nenhum momento, ele deixa muito clara essa visão que tem.
A diferença principal entre os filmes iniciais e esse aqui, é que os do Donner eram verossímeis, mas não eram tão “sisudos”, e o do Singer é justamente o contrário. Superman – O Retorno é totalmente sisudo, se levando a sério demais sempre, mas sem conseguir ser verossímil. Explicando melhor: Donner tinha a preocupação de passar uma verdade em relação ao herói. Afinal, era um ET que no planeta Terra tem super poderes, coisa que muita gente acharia difícil assimilar, ainda mais nos anos 70, então, na hora de passar essa verdade do personagem, Donner se preocupa em ser o mais verossímil possível. Toda história envolvendo a origem do Superman, com a destruição do planeta Krypton, a adoção por seus pais terrestres, a descoberta de seus poderes e etc, mesmo sendo fantasiosa, foi bem cuidada para que o público pudesse entrar naquele universo sem problemas. Mas depois disso, o filme se assume como uma aventura mesmo, investindo muitas vezes em cenas mais leves (principalmente com os vilões cômicos) e outras mais absurdas (como a cena do giro da Terra no final). Essa verossimilhança era usada somente para o público poder penetrar nesse universo, mas depois disso, o filme se colocava no direito de relaxar. Já Singer usou essa verossimilhança de antes só para justificar a transformação de tudo numa grande opereta, altamente dramatizada, fazendo o filme ficar pesado demais. E ele até tenta colocar humor em algumas cenas, mas falha drasticamente, porque o humor não é algo que surge naturalmente como antes, e sim algo posto lá de qualquer forma, só para dizer que o filme tem certa leveza, coisa que definitivamente, não tem. Mesmo assim, o humor usado aqui na maioria das vezes não tem a mínima graça (ou alguém realmente acha muito engraçado o filho da Lois chamar o Lex de careca?). Resumindo: Singer se põe em cada e todo instante como um fã alienado, e assim não deixa ou não consegue fazer o filme relaxar como Donner fez nos filmes dele.
Sobre a história: Superman – O Retorno se passa 5 anos depois de Superman II – A Aventura Continua. O herói teria abandonado o planeta Terra depois dos eventos do segundo filme, para ir ao espaço procurar pistas de sobreviventes de seu planeta natal. Então, o filme mostra seu “retorno” depois desse tempo que passou no espaço. O que muita gente pode estranhar ao ler essa história inicial é que ela caberia muito bem, depois do quarto filme, então pra quê confundir todos, enfiando essa história depois do segundo? Afinal, para muitos, são quatro, e não dois, os filmes anteriores. O detalhe é que Singer criou um personagem chamado Jason White. Não dá para dizer muita coisa sobre ele para evitar possíveis spoilers, mas ele é o filho pequeno da Lois Lane e pela lógica, ele só poderia ser inserido depois do segundo filme. O problema é que o desempenho pífio do filme em grande parte é culpa desse menino, já que ele é a personificação dessa alta carga dramática que Singer vomitou aqui. Então, em vez de relaxar, fazendo uma continuação que teria como base os anteriores, mas sem se prender muito a eles, Singer preferiu criar esse personagem, que particularmente não serviu pra nada, ao contrário, só atravancou a história, para assim ter uma justificativa e enfiar Superman – O Retorno depois do Superman II, se prendendo inutilmente demais a vários detalhes dos filmes iniciais. Mas daí surge outro problema: Por mais que tente evitar, o diretor acaba passando por cima de várias coisas ditas anteriormente. Ou seja, até os filmes que ele estava considerando para fazer este, ele não consegue obedecer 100%, surgindo assim vários erros de continuidade. Não crucifico tanto esses erros, que na maioria das vezes são inevitáveis mesmo, mas, como disse, o filme se leva a sério demais, então pesaram muito mesmo no resultado final. E nem posso dizer que são erros de continuidade propriamente, já que o Singer (ou algum fã mais ardoroso dele) pode ter todas as explicações sobre tudo que não bate muito bem entre esse filme e os anteriores. Assim, até mesmo aqueles que conhecem os filmes iniciais de cabo a rabo, vão ter que consultar um “manual de instruções” para entender ou compreender (aceitar, seria a palavra exata) certas coisas que Singer imprimiu aqui. O filme deveria funcionar sozinho e não depender tanto assim do que foi feito no passado.
O ponto positivo do filme é o seu visual. Tudo é muito bem cuidado e bem construído, tanto em relação a efeitos especiais, como na parte de cenários, figurinos e etc. O filme, pelo menos, é bonito de se ver. Nesse sentido, Superman – O Retorno é sim, grandioso, mas essa grandiosidade ficou só nessa parte técnica mesmo. Outra coisa boa que ocorreu foi a escolha do ator que passaria a ser o Superman. Brandon Routh consegue ter um bom desempenho tanto como Clark Kent tanto como Superman. Christopher Reeve teve um bom substituto nesse novo filme. Infelizmente, o resto do elenco não funciona tão bem. Kevin Spacey como Lex Luthor, e Kate Bosworth como Lois Lane, por exemplo, não diria que estão propriamente ruins, mas ambos sofrem demais por essa escolha do diretor em deixar tudo dramático demais, sendo assim, a meu ver, um erro mais de direção que de atuação deles. O Kevin, pela experiência que tem, até consegue se salvar, mas a Kate não. A atriz/personagem está totalmente fora do tom. Nem de longe lembra o ótimo desempenho da Margot Kidder nos filmes anteriores, que conseguia se equilibrar muito bem tanto nas partes mais densas como nas mais leves dos filmes do Donner. A Kate não consegue a mesma façanha, e passa o filme todo com a mesma cara. A única coisa que a ajuda é que tem um bom parceiro em cena, James Marsden, que interpreta seu marido, Richard White. O personagem é o mais agradável do filme e, conseqüentemente, o mais interessante que Singer trabalha dentro de sua opereta.
Finalizando: Sou fã do Superman e de seus filmes (dos três primeiros, diga-se). Pra mim, ele ainda é o herói definitivo vindo das HQs, então torço sempre para que um dia, ele volte em grande estilo às telonas. Infelizmente, isso não ocorreu aqui. Mas estou aguardando o próximo filme: Superman – The Man of Steel. Se for ainda sob a direção de Singer, então espero que seja o mesmo que dirigiu magistralmente X-Men 1 e 2, e não esse fã alienado que tão preso ao passado não deixou Superman – O Retorno alçar vôos maiores.
2/4
Jailton Rocha
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