A Invenção do Cinema (Especial Anthony Mann)

Serge Daney localiza o título do seu livro, A Rampa, como extraído de um local que ainda não era especificamente uma sala de cinema. Nos velhos teatros franceses onde foram erigidas (ou melhor, adaptadas) as novas salas de exibição ainda se podia ver, entre coisa e outra, pedaços de sua forma antiga: aqui, um velho cenário deformado e descontínuo; lá, o resto da rampa que conduzia até o palco, onde agora se vê o branco da tela de cinema expulsando o ator e o cenário ao vivo em favor de algo muito maior e, depois da Cahiers du Cinema e dos anos 60, talvez mais cheio de ego. Daí a rampa, o símbolo da ambiguidade, pois de alguma forma ela ainda levava o espectador e a arte a algum lugar em comum para serem olhados, e daí o filme, esta nova casa do autor. Tela esta, digamos, pré-cinemascope, mais quadrada do que retangular (um retângulo “em pé”), que afirmava, decerto, a idade do cinema: a de um tempo muito curto, recém-nascido, à espera da ascensão de uma linguagem ainda por se inventar que, de muitas formas, para alguns, derivaria das experiências conjugadas do teatro e da literatura (movimento e sentimento, provavelmente, quem sabe?). É onde talvez localizemos o cinema de Anthony Mann, nesta lacuna de tempo, de estilo e de forma a ser preenchida e inventada. Muitos de seus filmes ajudam a contar a história do cinema e dos gêneros dentro dela a partir de um problema que muitos cineastas enfrentariam no decorrer de todo aquele século em que o cinema se fortificaria em sua forma de narrar e de apreender a (re)criar o (um) mundo. Mann possuía um caráter importante, que os grandes cineastas do período dito clássico possuem: serem, de fato, cineastas de um período pré-clássico, do presente do cinema, cineastas de um mundo ainda por inventar, aquele da invenção do “clássico”. A questão maior do cinema de Mann, em diversos momentos de sua extensa filmografia, era de saber colocar/estar com a câmera no lugar certo. E, mais do que isso, saber movimentá-la para descobrir o cinema no desvio para o quê olhar em quadro, para destruir a confusão do espaço consolidado e marcado do teatro, onde o olho do mundo é obrigado (e tiranizado) a ver o ator e sobretudo a encenação como puro espetáculo e gozo dramático. Era onde a emoção da descoberta nunca estava associada com o extracampo em campo, uma noção de teatro, que assumiria, quando aprendida, uma dimensão dramática maior no cinema.

Neste sentido, neste nervo obrigatório da herança da encenação teatral a ser rompida, Anthony Mann tem um filme de cinema por fazer – afinal, ele, o cineasta, veio daí, do teatro, da observação de tudo aquilo que, de algum modo, encena e vive para o sentimento do outro. E ele constrói este filme basicamente naquilo que aponta para a obrigatoriedade do olhar ao se submeter à falha da falta de tela a nos separar de um amplo espaço (o filme, um mundo feito para o olho, essencialmente), como imposição de observar um campo fixo, o daquele que atua frente aos nossos olhos. O Grande Flamarion(1945) versa exatamente sobre esta dualidade cinema/teatro, porque o protagonista do título, feito por Erich Von Stroheim, é de fato um objeto em cena – objeto enganado cruelmente tanto por dentro (por uma femme fatale, feita pela Mary Beth Hughes) quanto por fora (ele é um personagem que sobrevive do teatro encenado eternamente, mas aciona um flashback de cinema para se libertar e se colocar de novo em seu lugar de protagonismo, em sua reencenação eterna, tudo na mesma tela). Objeto que obriga a todos centrarem seu olhar em seus movimentos calculados e perfeitos, o que não veríamos nos anos 50, quando os heróis de Mann precisavam criar movimentos humanamente imperfeitos para olharmos ao vivo, por exemplo a personagem de Barbara Stanwyck em Almas em Fúria (1950), o de Farley Granger em Pecado Sem Mácula (1950) e o de James Stewart em O Preço de um Homem (1953), quando toda a ação já vinha ligada ao movimento de uma linguagem que, em cinco anos já tinha atingido um ápice de comedimento e aprendizado (para onde e para quê olhar – temos, agora, um limite essencial imposto pelo quadro). A partir do uso do flashback, este recurso da reversão do tempo de cinema e da vida, Mann sempre nos dá a velha chance típica do cinematógrafo, a de ver de novo, de forma sempre igual. É aí que o ambíguo se faz forte, pois o teatro, palco físico ou não de Mann em muitos de seus bons e maus filmes, é um local do passado, ultrapassado, recriado para nós, revigorado na efusão da nova linguagem – que é sobretudo, ainda, uma técnica com coração próprio, a se explorar. Vamos aprender as confusões da linguagem, por exemplo, em Strange Impersonation (1946) ou em Entre Dois Fogos (1948), quando a câmera está mais interessada em captar imagens impressionantes (numa cena, tudo está turvo pela neblina) do que constituir uma narrativa propria e devidamente pronta.

Entretanto, há uma cena em Os Que Sabem Morrer (1957) que já é totalmente cinematográfica, onde Mann se livra da herança do teatro se utilizando de alguns de seus pressupostos de subtração cênica. No início do filme, a câmera de Mann passeia de um ponto a outro para encontrar um soldado tentando comunicação com um extracampo inatingível. Só esta situação (o contato com o que não está à vista nem para os personagens, nem para nós, nem para a câmera, mas, ainda assim, um espaço que existe) estrutura uma visão de cinema extraordinária – não há flashbacks, não há offs, há sim a presença constante da imagem da urgência física e mental. O plano descortina a impossibilidade de não haver comunicação com o entorno que cerca a situação do filme, ao mesmo tempo em que torna o local uma região impossível de receber socorro – é aquilo, primordialmente, que a mise en scène dirá a cada plano e a cada novo obstáculo (que pode ser “o socorro existe, mas não virá para este filme, para esta situação”, mais ou menos), pois o cinema possui suas regras cruéis estabelecidas, ao contrário da obrigatoriedade do olhar do teatro, da revelação cruel de diversos dos seus recursos. A situação cênica do filme é de uma teatralidade de recursos incrível: uns poucos soldados americanos tentam encontrar um local seguro para poder se refugiar e se reerguer. É somente isto. O inimigo, que aparece poucas (e sempre em número pequeno) vezes, está mais presente em sua ausência. É um estudo de linguagem, este que Mann radicaliza aqui e em O Homem dos Olhos Frios (1957), quando corta do assassinato de um médico para a cena da festa que toda a cidade preparava para ele que agora é um cadáver em seu próprio aniversário.

Do teatro existe uma partida de caminho tremenda para aquilo que realmente importa dentro dos limites da subtração (temos um mesmo cenário de vegetação seca, estranha aos soldados, meio desértica, totalmente misterioso e perigoso) e a criação do efeito câmera/movimentação extrai todo um mundo de cinema possível e próximo como o inimigo, um cinema que sobrevive de pouca coisa, da insinuação do lado oposto do conflito na utilização simples dos objetos de cena. Porque tanto em Os Que Sabem Morrer quanto em O Homem dos Olhos Frios a cenografia e o rosto de Robert Ryan e Henry Fonda, captados por Mann, revelam o outro lado a temer: o inimigo está localizado, na verdade, em sua barba eternamente por fazer, no sol escaldante, e também nas roupas – e não nas bombas e armas: decerto, uma lição do teatro, mas desfigurada por tudo aquilo que está fora de quadro realmente existir de forma palpável em sua constante ameaça surda-muda e não apenas como um recurso de cena (também porque não é só a importância que Mann dá aos atores que faz residir um local de cinema nos filmes, e sim as diversas situações dos soldados e cowboys, como enfrentar minas enterradas na floresta e aprender a atirar, o que gera uma cenas brilhantes). Se nos filmes dos Lumière a importância residia em observar determinadas coisas em movimento (lembre-se aí, do efeito que Godard, grande apreciador do cinema de Anthony Mann, causa com a espuma do café na xícara e as folhas se movimentando nas árvores, em Duas ou Três Coisas que Sei Dela, 1967; ou a importância que Hong Sang-soo dá à aparição do sol numa cena de Turning Gate, 2002), nos de Mann importava colocar uma narrativa em quadro, também em movimento constante, importava a expressão do ator e, quando havia, a da câmera. Todos os belos enquadramentos e reenquadramentos angulosos de O Homem dos Olhos Frios são essenciais para apreender isso.

Da mesma forma que Mann descobria a câmera aos poucos, ele também descobria que ela é a responsável pelo encurtamento dos espaços, e não só a montagem – ele descobria sua linguagem própria, sua linguagem de escrita, de delimitações precisas, dos elementos antagônicos descobertos próximos demais apenas por um movimento brusco do operador. Para além da teatralidade de certos filmes seus, mortos em termos de coração na técnica narrativa e de interpretação exacerbada que se desenvolvia como clássica (em Pecado sem Mácula, todas as infelizes coincidências filmadas por uma técnica viva e incrível por si mesma, na velha incompetência de alguns atores desimportantes), onde parece haver, antes de tudo, um desejo de cinema bruto acima de todas as coisas (em Entre Dois Fogos, toda a seqüência da visita à cadeia com o brilho intenso e surreal nos olhos de Claire Trevor – o roteiro é deixado para trás pela composição), encontramos um coração de simplicidade enorme, que corresponde, certamente, à invenção do cinema, ao período em que formavam-se ainda os clássicos a se seguir e a se estudar em seu modo de funcionamento, em seus desvios de linguagem e em suas rupturas com o todo e com o acordo das partes (as cenas, muitas vezes, mais surpreendentes do que a totalidade do filme) com o todo.

Por exemplo, em Região de Ódio (1954) – e também em E O Sangue Semeou a Terra (1952), filmes meio gêmeos na forma – , possivelmente seu melhorwestern com James Stewart, temos um mundo repleto de perigos bastante próximos, encurtados pela filmagem e não somente pela literatura do roteiro nem pela teatralidade literária da trama. Logo no início, Jeff (Stewart) empreende uma fuga por dentro de um barco; em seguida, tudo o que vai acontecer no filme terá a ver diretamente com esta fuga: mais fugas, um flerte meio atrapalhado de Jeff com uma mulher (flerte não bem resolvido por Mann), a fronteira aberta para a volta a um local onde a morte é coisa prometida, etc. – está tudo bem ao alcance das mãos de todos os personagens, bons ou ruins. A estrutura do filme está nessa proximidade dos fatos que lhe são importantes; ele é ágil e cruel, bem como o pode ser Jeff (porque no cinema, em sua invenção de acordo com Mann, alguma coisa faz a forma do filme ser um pouco como todo protagonista seu – as mulheres saindo da fábrica e o trem chegando a estação são filmes sobre eles mesmos, para voltarmos aos Lumière). A morte de um dos protagonistas, feito pelo Walter Brennan, é de fato preparada com os quase sessenta anos do cinema já passados e apurados pela técnica de narrar com precisão: toda uma estrutura do filme é emprestada e constituída à observação de que alguma coisa vai acontecer a este personagem, porque a narrativa começa a lhe dar alguma importância que antes não era devida, e que era, isto sim, até mesmo interditada – ele é a velha bússola moral e, por enquanto, nada mais que isso. A sua morte é que o coloca na posição de homem-a-ser-escutado.

Já aí, tínhamos um Anthony Mann ciente da linguagem, ciente de onde o cinema poderia chegar, principalmente quando, à frente, encontramos filmes como El Cid (1961), uma espécie de libelo de cinema pronto para dar aulas e discursar, através de imagens, sobre produção, sobre História (equivocada ou não, mas História, roteiro preciso e maior a se seguir e a inflar pelo tamanho das coisas em cena) e sobre o sumiço do protagonista que tanto alimentou o teatro e o cinema durante toda a vida – é um arranjo imenso de cinema, decerto forte em imagens, mas mal ligado com o drama delas, porque Mann estava ligado à tradição do cinema, que, no filme, era a de mostrar tudo o que se podia construir para uma obra cinematográfica funcionar como realismo do olhar presente ao fato, o que se configurava como mais um passo tardio do cinema rumo a si mesmo. A tragédia de El Cid é uma tragédia diferente, porque ela é uma tragédia do espaço. É uma tragédia que enuncia a capacidade de criar cenas para o trágico independente de uma noção dramática de apuração técnica viva. É uma tragédia nova, que seria amadurecida em A Queda do Império Romano (1964), só que ao contrário (a técnica importava muito e recebia um local maior de protagonismo), com os movimentos suntuosos, ainda mais cinematográficos e intangíveis.

Nisso, parece que Mann chegava aos gêneros como se chegasse ao espaço do nada-ainda-não-conquistado. Vendo O Homem do Oeste (1958) talvez a afirmação se torne válida, porque o oeste de Mann é aquele em que o homem velho tem sempre algo a transmitir e que, por este motivo mesmo, deve ser ouvido, mesmo quando aparentemente este não dá informações preciosas sobre nada (mais uma vez, algo de O Homem dos Olhos Frios: Henry Fonda é a própria informação maior na barba por fazer e no cadáver que traz atravessado no cavalo), nem sobre algo a dizer para poder conquistar e fazer, dessa conquista, alguma coisa nova. Isso acontece mesmo que este homem seja um bandido e que aquele que precise voltar para ouvi-lo tenha sido algo como seu filho e seja agora seu inimigo por uma questão de lado oposto à forma de ver a vida e o próprio oeste. A subversão de Mann neste filme é bem simples: é uma afirmação ao construir um mundo, ao criar o cinema. Ele veio, em sua primeira experiência com as imagens, de um local até hoje sem linguagem que suscite um interesse geral em se registrar – a linguagem que Mann operava, antes de partir para a direção de cinema, era aquela oculta de criar pequenos lapsos de dramaturgia dispensável para o grosso do produto final: ele trabalhava como diretor de testes de atores para David O. Selznick, sua importância era velada na tela ao mesmo tempo em que era grandiosa em suas escolhas de atores e atrizes para filmes de outros cineastas.

Se não há linguagem, portanto, ele há de criá-la ou remoldá-la, como é o caso do seu ato ao olhar para o western. Com os filmes protagonizados por James Stewart, Mann inseria uma variante psicológica nos seus personagens. Havia, assim, uma imprevisibilidade da ação e do gesto (podemos resumir: como James Stewart fará para resolver o problema com seu irmão em Winchester ’73, 1950? Ou a filha com o pai em Almas em Fúria?) como aquele, extremo, de arrastar com uma corda um homem morto em O Preço de um Homem ou de ser arrastado por cavalos pela areia em Um Certo Capitão Lockhart (1955). Para O Homem do Oeste, a afirmação é simples: não se trata de outro oeste, mas de um oeste novo, que, na verdade, Mann faz parecer primitivo, puro e, sobretudo, o último oeste ao qual teremos a oportunidade de ver – daí, todo o crepúsculo aterrador quando o trem deixa o personagem de Gary Cooper para trás: é todo um oeste para ele conhecer, é tudo inédito e finito. É um gênero que Mann faz surgir ao mesmo tempo em que é criado para que seja dado, naquele instante, um testamento cruel sobre seu próprio fim. Por isso, passam longe as convenções: o amor seria de um pai pelo seu filho, que se resolve numa decepção que não se materializou numa vida de ladrão; um filho que precisa, sempre, ouvir seu pai de novo, para ultrapassá-lo e destruí-lo, porque a moral que se impregna nos westerns de Mann é a de que a moral sempre é a do protagonista, seja ele qual for (por isso, esta é constantemente renovada, mesmo que, no fundo, ela possua um mesmo motor desviado de acordo com a personalidade daquele que a carrega e mantém – é uma lei do cinema); não há mais arma para o protagonista (e é curioso como a lógica de ação dos westerns de Mann passa por duas grandes situações “desarmadas”: aquela de James Stewart no saloon em Winchester ’73 e todo o grosso de O Homem do Oeste, com Gary Cooper desarmado o tempo todo, sobrevivendo somente pelo significado das palavras que profere); não há mulher para o herói, há, isto sim, um mundo livre e novo a percorrer antes que o filme acabe.

Para um mundo novo, um mundo de cinema nascente e de criação em Mann (e isso também quer dizer, na linguagem da indústria), todo retorno é o local do segundo ato de olhar não para encontrar algo, mas para descobrir uma possibilidade. Há tantos retornos do Glenn Miller de James Stewart àMoonlight Serenade, em Música e Lágrimas (1953), que seria impossível não descobrir nela, cedo ou tarde, uma obra-prima completa em sua remodelação constante. O cinema como fonte eterna das imagens eternas – certamente não falaríamos em Mann, hoje, se o caso fosse outro – progride na criação de sua linguagem. Um dos pequenos avanços românticos se deve a Strange Impersonation e também a O Pequeno Rincão de Deus (1958). Em ambos, Mann trabalha com a ideia de modulação do entorno dramático. Coisa nova, movediça e perigosa. Ele volta, é preciso sempre retornar para construir o drama em cinema – ou possuir um passado palatável, diria, mais uma vez, Godard.

Em Strange Impersonation, a volta é para um estágio totalmente fácil de lidar e construir, enquanto ele mesmo nos engana: um sonho diz muito sobre a remodelação da realidade e é por isso que, nele, vemos uma mulher mudar de rosto e de vida após sofrer um acidente grave e ter a face destruída. É um recurso que o teatro talvez encontre dificuldade em encenar, porque ao se fechar os olhos não é sempre que podemos estar em um sonho. Entretanto, o sonho do cinema, em determinados filmes, é não parecer um sonho, e Mann, ciente do problema, trabalha todos os movimentos do filme a partir de uma impossível verossimilhança, o que o torna, todo ele, um recurso em si, forte, pesado, dramático o suficiente para se auto-destruir no perigo que o cerca, o do recurso, o da peça pregada, o do dispositivo como jogada maior do intelecto enganador do cineasta, o da ultra-impossibilidade de crer na imagem – quando o cinema se assume sonho ele geralmente vence. Em O Pequeno Rincão de Deus, é um retorno ao personagem, ao sangue do corpo, ao desejo, à destruição da imagem que estes corpos constroem como se fossem vida. Toda face da indústria de Hollywood, quando produzia um filme como este de Mann, se voltava para dar ao corpo do personagem toda a fome da carne e do suor. Por isso, de uma alucinação quase inocente e doentia do personagem sublime de Robert Ryan que vive de procurar ouro durante quinze anos nos arredores de sua casa, a viagem se faz num caminho muito diverso: voltamos à casa (e não ao encontro do ouro no entorno), àqueles que moram nela, às suas vidas desajustadas, à uma espécie de realidade social do estúdio, onde o estúdio quer se rebelar como um dos personagens que é assassinado ao religar a energia de toda uma cidadezinha dos EUA. É decerto um dos filmes mais fortes dos anos 50, porque todo o texto sexual o coloca à altura do chão e da força da matéria sobre o Homem. O espaço para o voo alucinatório de Robert Ryan é contido em favor de um voo dramático do seu personagem. Ao olhar sempre para fora, aquilo que ficou dentro de casa se rompeu de tal forma que não sustenta mais o sonho. Da mesma forma que o grande sonho de Strange Impersonationtambém não poderia ser sustentado: trata-se um belo sonho enorme, um pesadelo alucinante, devidamente formal, talvez motivado pela droga experimental que a protagonista usa como cobaia, aquele sonho em que um médico pode fumar na sala de cirurgia e não ouvir reprimendas por isso.

Deste modo, voltamos à realidade aos pedaços, conforme a ambiguidade das velhas salas de cinema faziam questão de elucidar ao alcance dos olhos de qualquer um – “estamos ainda diante de uma arte jovem, sem lugar próprio, porque a sala de cinema é a antiga sala do teatro”, é a frase do nosso problema. Devemos muito ao cinema e o cinema a Anthony Mann, porque nos seus filmes, apesar de tudo aquilo que foi neutro e pouco cinemático (Música e Lágrimas), formal (Winchester’73; E o Sangue Semeou a Terra; O Preço de um Homem; Região de Ódio; Um Certo Capitão Lockhart), extremamente um grande exercício de criação (O Homem dos Olhos Frios; O Homem do Oeste) ou do caráter de dar a luz, à força, a um sentido de cinema a partir do teatro e de seus velhos arremedos de linguagem que não morreram de todo (O Grande Flamarion), para as qualidades e os defeitos, instituíu um dos momentos mais importantes da vida da arte, aquele que cataloga a história do cinema, como a conhecemos pelos subtextos dos filmes que tanto apreciamos. Pelo menos vemos isso em parte, quando ele, Mann, nos revelava os restos de uma linguagem nova se esquivando de uma antiga, nascendo com a violência da química e do movimento da fotografia e a transformava, na criação da simplicidade como lugar supremo da linguagem, numa experiência de acompanhamento da maturidade a olho nu.

Ranieri Brandão

24 Comentários

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24 Respostas para “A Invenção do Cinema (Especial Anthony Mann)

  1. Maicon

    UAU! como eu faço pra bater palmas em um comentário! o texto está absurdo! (tenho leitura dinâmica e posso me gabar de ser o primeiro a ter lido :P)

  2. Maicon

    Penultimo Post (snif) hora de acompanhar a cerimônia de premiação e retrospectiva do Oscar Anthony Mann:

    Comentários de Jose Wilker e Rubens Ewald Filho

    Mestres de cerimonia: Alec Baldiw e kim Basingher

    ________________________________

    Até o lançamento do post com o ultimo filme, o especial de Anthony Mann já tinha durado:

    38 dias,
    18 horas
    e
    34 minutos

    teve

    36 postagens

    e

    33 filmes

    JW: Apesar das afirmações dúvidosas vindas dos próprios membros do blog, o “timing” foi exemplar, postagem constante, media de 1 filme por dia e meio…
    RE: Sim, porem, trocaram a ordem de apresentação duas vezes e até a autoria de um post, detalhes sem importância.
    JW: mas que ficam registrados, obviamente.
    RE: Vão começar os prêmios tecnicos

    melhores efeitos visuais em um post, apresentação de James Cameron:

    And the Oscar goes to: Luis henrique Boaventura, por Reign of Terror.

    RE: até hj não consigo descobrir como ele conseguiu remanejar os screenshots para um segundo post oculto.
    JW: Isso é trabalho de tecnologia de ponta!

    melhor fotografia de screenshots, apresentação de Michael Haneke:

    And the Oscar goes to: Fernado Mendonça, por Border Incident

    JW: A rolagem das imagens é assombrosa

    _____ comercial__________

    A participação do público foi medida em:

    321 comentários

    sendo

    63 em Top western
    41 em tOP Noir
    22 em El Cid

    os TOP posts

    Melhor Comentador Coadjuvante, apresentação de Scarlett Johansson

    indicados:

    Caio lefou
    Maicon
    Mateus Silva

    And the Oscar goes to: Maicon, pelo total de 63 comentários (Caio=33, Mateus Silva=15)

    RE: Obviamente esse premio não leva em consideração a “qualidade” dos comentários.
    JW: …

    Melhor postagem em lingua estrangeira (surtada), apresentação de kristen Stewart e Silvester Stallone

    Indicados:

    Daniel Dalpizzolo, por God’s Little Acre
    Luis Henrique Boaventura, por The Bamboo Blonde
    Luis Henrique Boaventura, por Strategic Air Command

    And the Oscar goes to: Luis Henrique Boaventura, por Strategic Air Command

    RE: Estranho, mas era realmente o post mais diferente.
    JW: Os outros dois eram categoricamente dentro de um padrão multiplot
    RE: Espero que o proximo bloco seja menos excentrico

    ________comercial___________

    Em breve: Especial “the twilight saga”, no Multiplot!
    versão video digital no Multiplot! HD max (disponível em net e sky HD+)

    ________comercial____________

    Comentários que vc pode não ter visto, mas aconteceram, só procurar:

    – Ataque feminista ao Multiplot
    – Godard comenta os westerns de Mann
    – oi! querem transformar seu blog em site?

    Melhor roteiro adaptado de uma discussão adoidada, apresentação por Eddie Murphy e Ben Stiller:

    indicados:

    Daniel Dalpizollo e Maicon por “Valor de um roteiro”, em Strange Impersonation
    Caio lefou e luis Henrique Boaventura por “Mann vs Mann”, em The Naked Spur
    luis Henrique Boaventura e Maicon por “minha lógica TOP”, em Top Noir e Top Western

    And the Oscar goes to: luis Henrique Boaventura e Maicon por “minha lógica TOP”, em Top Noir e Top Western

    JW: Esse premio custou caro ao pobre Maicon
    RE: Entrou na lista negra de dois editores do blog ao mesmo tempo…

    Melhor Comentador em papel principal, apresentação de Meryl Streep:

    indicados:

    Daniel Dalpizzolo
    fernando Mendonça
    Ranieri Brandão

    And the oscar Goes to : Daniel Dalpizollo, pelo total de 52 comentários (Ranieri=45 fernando=44)

    Jw: Ainda não ganha dos postadores coadjuvantes
    RE: Ficaria em segundo num ranking geral
    JW: lembrando que Thiago Duarte foi o unico editor que não postou NENHUM comentário ao longo de especial, nem em seu próprio post.
    RE: Quanto descaso com a legião de fãs afoitos por comunicação…..
    JW: vem ai o grande momento da noite

    ___________ Comercial_______

    Melhor diretor em um especial de Anthony Mann, apresentação de Quentin Tarantino, Robert Rodriguez e Pedro Almodovar:

    And the Oscar goes to: luis Henrique Boaventura

    JW: É um grande diretor em ascenção, premio merecido pelo trabalho duro.
    RE: embora atrapalhe um pouco o seu problema com elaborações de Tops que a mídia insiste em não divulgar
    JW: dizem que ele andou frequentando clinicas de reabilitação para o aprendizado de hierarquizar filmes
    RE: o premio pode ser um grande marco de reinvenção
    JW: e resta o premio mais aguardado

    Melhor texto do especial Anthony Mann, apresentação por Tom (mala) Hanks:

    indicados:

    Daniel Dalpizollo, por Desperate
    Fernando mendonça, por Border Incident
    luis Henrique Boaventura, por Devil’s Doorway
    Murilo Lopes, por The Last Frontier
    Ranieri Brandão, por The Great Flamarion
    Thiago Duarte, por Winchester ’73
    Thiago Macedo Correia, por Men in War
    vlademir lazo, por The Fall of the Roman Empire

    __________comercial__________________

  3. Daniel Dalpizzolo

    Caralho! ahaahahahahahahaha

  4. O resultado só vai sair no texto a seguir? hahahaha

  5. Daniel Dalpizzolo

    Ranieri ansioso :B

  6. caiolefou

    Que putaria!!! Gostei…

    E parabéns Ranieri, pelo único texto seu que entendi alguma coisa! E tá muito bom, viu.

  7. Brigado, Caio! Tinha que sair um desse algum dia, né? hehe

  8. Ansioso mesmo, Dan! Ganhei nada, até agora! hahahahaha

  9. A vitória deve ir pro Dalpizzolo.

    O último parágrafo do texto de Desperate tá destruidor.

    Ah, bah, comentários de Wilker e REF. puts, não merece ser visto, então.

  10. Maicon

    Aeh Boa Mateus! bom saber que alguem toma partido por aqui ,além de mim! heheeh ninguém mais aposta? o critério foi bem objetivo!

  11. Acompanhei a cerimônia hoje cedo e perdi meu ônibus pra Universidade por causa dela (provavelmente o comentário mais comprido do MP! para o post idem), pra no final ver que terminava em comercial. Tá, só não explodi o PC porque estava secando as lágrimas pelo prêmio que recebi.

  12. caiolefou

    Haha, são tantos gênios reunidos num lugar só… NOT

  13. Anônimo

    Caramba,texto épico do Rainieri…
    Dos que eu li o que mais gostei foi mesmo o texto do “Reign of Terror”,mas ele não foi nem indicado…como diriam os fãs de Restart:”Puta falta de sacanagi!!!

  14. K.Lincoln

    e novamente eu esqueço de colocar nome…

  15. caiolefou

    O prêmio “mulheres mais gostosas da década de 50 reunidas em um único filme” é do Mann também. O Pequeno Rincão de Deus apresenta algumas hot girls bem acima da média, mesmo para padrões de hoje.

    Tá, nada foi mais inútil do que esse comentário. Mas é que eu reparei nisso mesmo, juro. Enfim, é o fim.

  16. Maicon

    Devil’s Doorway > Reign of Terror

    Mas fique satisfeito, ele ganhou de efeitos visuais e era a segunda opção com certeza, a academia foi bem disputada ao apontar os indicados da categoria final.

    Caio tem razão, mas enaltecer um não significa necessariamente rebaixar todos.

  17. K. Lincoln

    hahaha mais um bom motivo para eu ver o Pequeno Rincão…só o bitcomet terminar de fazer o seu trabalho…

  18. K. Lincoln

    Ah nem sei viu,senti que o “Reign of Terror” foi o renegado da vez haha
    Mas pelo menos levou um Oscar técnico…e Devil’s Doorway também tá fantástico,acabei de reler.

  19. Maicon

    Luís Boaventura tem um fã! [/nelson]

  20. Thiago Macêdo

    Que isso, ficou tudo massa! O texto do Ranieri (levei seis vidas pra ler, mas ficou muito bom) e o comentário maluco do Maicon. hahahaha

  21. Ê! Agora faltam só 398 pra chegar no Daniel.

  22. Maicon

    Trilhando os passos vc chega lá!

  23. 6 vidas, Thiago? hahahahaha. Mas valeu pela leitura, rapaz!

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