Strangers in the Night (Anthony Mann, 1944)

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Strangers in the Night é o mais antigo filme de Mann que encontramos na web e é por isso que abrimos o especial com ele, mesmo não sendo seu primeiro trabalho com cinema. Enfim, é praticamente impossível acreditar que este pequeno filme (são apenas 50 minutos produzidos com menos recursos do que os que usam pra fazer o jornalzinho do bairro) de mistério seja realmente bom, e somente por se tratar de um filme feito no mesmo ano de Laura de Otto Preminger (com o qual divide muitos interesses e características – e por mais que seja covardia comparar qualquer filme com aquilo) seu esquecimento quase que completo parece ser até compreensível.

Como todo bom noir anos 40 o filme evidencia a instabilidade das emoções humanas durante e após a Segunda Guerra e tudo na trama é muito claro a partir deste panorama de desilusão que parece impregnado no ar desses filmes noir (qualquer semelhança com um trocadilho páblico é mera coinscidência). Em alguns poucos personagens Mann explora sentimentos como solidão, obsessão, desamparo, loucura e o amor em um filme quase exageradamente conciso – e nem por isso reducionista (pelo contrário, a amplitude que consegue dar aos problemas de cada personagem faz o filme ter estrutura bem distante da de um média-metragem).

E realmente esse Strangers in the Night tem algumas sacadas incríveis, que só poderiam vir de um mestre como Mann (primeira frase de efeito tosca do especial!). A exemplo de Preminger, Mann constrói uma sensação de onipresença mórbida (lá de uma mulher que supostamente já morreu, aqui de uma que sequer nasceu) através de uma imagem específica, de um simples quadro que em virtude da amplitude dada aos enquadramentos consegue sempre um jeitinho de participar dos planos – e mesmo quando não participa está ali, firmemente presente naquele local em que acontece boa parte das principais cenas, e que portanto como sabemos que está ali etc.

Aqui a ironia de Mann está afiadíssima e mesmo o exagero das interpretações (aquela velha toda dramática é uma bosta, principalmente na cena final que é genial mas que ela quase consegue foder) não tira os méritos dessa pequena brincadeira. E digo brincadeira mesmo porque apesar de todo esse tom de desolação do noir, que realmente dá certo peso à ação e aos dramas dos personagens, coisas como aquele plano final e a forma com que [/spoilers ohhhhhh my fucking god ohhhhh!!!!!!] a velha morre [/fim do spoiler] só podem ser filmadas por alguém que curte muito uma sacanagem, o que faz de Strangers in the Night acima de tudo um filme menor bastante divertido de se ver.

3/4

Daniel Dalpizzolo

15 Comentários

Arquivado em Comentários

15 Respostas para “Strangers in the Night (Anthony Mann, 1944)

  1. Um Mann obscuro de 50 minutos deve valer a pena…

  2. Daniel Dalpizzolo

    ô se vale. nem comentei ali, mas porra, até acidente de trem em plano aberto mann meteu nesse filme. fala sério, bicho.

  3. Pois é, uma coisa que tem me impressionado muito é a pequena duração destes primeiros filmes. Os minutos nas mãos de Mann parecem pão e peixe com Jesus, dão e sobram! Ah, se Peter Jackson e James Cameron vissem isso…

  4. Não sei sobre pães, peixes, jesus… Mas sim, o Mann inventou e patenteou um tempo só dele no cinema, e não, de jeito nenhum que James Cameron pode ser colocado no mesmo saco que Peter Jackson.

  5. hahaha, qual saco você prefere Luis?

  6. Daniel Dalpizzolo

    Cameron tá mesmo a anos luz à frente de Jackson (que é um boçal).

    Quanto a Mann, conversavamos outro dia, Luis, Vlademir e eu. Esses diretores da RKO (Mann, Tourneur, Lewies, Ullmer, etc) tinham uma habilidade fantástica em aliar o máximo da expressividade a poucos e objetivos planos.

  7. Maicon

    Dalpizollo, quando vc qualifica a amplitude que o Mann consegue adicionar ao roteiro mesmo com a estrutura de média-metragem, andei vendo que isso é justamente apontado como uma das falhas do filme, pelo fato de o diretor ainda não ter experiência o bastante para compensar os diálogos longos e constantes necessários para a resolução da história.

  8. Daniel Dalpizzolo

    Esses diálogos existem, mas nem são tantos. O filme é bastante movimentado por possuir apenas 50 minutos. Pra se ter uma ideia o prólogo se passa mesmo na guerra, ela não é meramente mencionada. Um filme que fosse excessivamente falado não teria condições de suportar cenas como esta, que toma já de cara uns cinco minutos – ainda mais sabendo-se que tem tantas outras que conferem in loco algumas problemáticas importantes pra construção das personagens.

  9. Maicon

    entendo…outra coisa, citam o final do filme como algo “involuntáriamente divertido” e que drena a força do drama. Pelo que li do seu texto vc considera isso uma sacanagem proposital do diretor, certo?

  10. Daniel Dalpizzolo

    Onde é que você tá lendo essas coisas? haha. Sei lá se é involuntário ou não, sei que se for o cara é involuntariamente sacana por filmar aquilo daquele jeito.

  11. Maicon

    “Anthony Mann, new and expanded edition”, de Jeanine Basinger.

    como eu disse antes pro Luis, fiz a lição de casa! ;)

    Sobre Stranger’s in the night eles destacam a fotografia expressiva, a forma como o estereótipo de “aberração psicológica” da personagem principal iria influenciar os futuros protagonistas de outras obras e como diretor confere poder sobre a atuação da mesma em cenas como a da revelação da verdade à respeito de Rosemary, e todos esse yada yada que devem fazer muito mais sentido pra quem de fato conseguiu ver o filme (o que não é o meu caso heeh)

    mas me contento em ler sobre ele aqui no blog :)

  12. Daniel Dalpizzolo

    A atuação dela é uma bosta, o único poder que ela confere é quase cagar com as melhores cenas.

  13. Maicon

    por isso mesmo, o “diretor” confere poder a ela, foi o que eu disse, e não me referia a uma qualidade da atriz.

  14. É impressionante como o Mann consegue colocar tanta coisa em 50min. Ele faria isso outras vezes, com durações um pouco maiores, em alguns filmes subsequentes dos anos 40. Filmes com pouco menos que 1h30min de duração. A maioria fantásticos!

  15. E agora ando impressionado com o Maicon… rsrsrs

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