Zero de Conduta (Jean Vigo, 1933)

A transação cinematográfica dá a forma. A social, o conteúdo. Zero de Conduta, penúltimo dos poucos filmes do francês Jean Vigo (mais conhecido pelo clássico O Atalante, e que morreu logo depois de finalizá-lo por causa de uma crise de tuberculose), talvez reflita em seus sensíveis e hipnotizantes 40 minutos algumas das imagens mais importantes dos registros fílmicos das primeiras décadas do século XX, e embora normalmente as afirmações do tipo sejam pouco funcionais, justifica-se como um dos mais fundamentais momentos do cinema pré-Cidadão Kane (somente utilizando uma demarcação histórica de compreensão instantânea).

O filme basicamente traduz para celulóide o sentimento de revolta social para com a repressão, concentrando-se em um grupo de crianças que dias depois de retornarem das férias ao internato onde estudam realizam uma mobilização contra a severidade de seus professores. Um discurso aparentemente desgastado, mas que impressiona justamente pela maneira como Vigo dá forma ao seu radicalismo, revigorado por um crescendo narrativo impecável que vai da doçura até a efervescência sem jamais quebrar a essência de Cinema – e não são poucos os filmes de esquerda que esquecem da mídia para fazer panfletagem.

Porque Zero de Conduta é magia pura, genuína, daquela que faz com que paremos nossa rotina para fixarmos o olhar numa tela de tevê durante duas horas, três, ou mais. Um casamento perfeito entre a forma e o discurso, que consegue ao mesmo tempo transmitir um encanto quase ingênuo e impressionar pela força de seu argumento. E é também um dos maiores exemplos de cinema anárquico e libertário já produzidos, simplesmente porque nada pode ser mais delicioso do que ver a sensação de liberdade ganhando forma em uma guerra de travesseiros.

4/4

Daniel Dalpizzolo

4 Comentários

Arquivado em Comentários

4 Respostas para “Zero de Conduta (Jean Vigo, 1933)

  1. Daniel…não vi Zero de Conduta, é um dos filmes que quero ver antes dos tops da década de 30 ( tem tempo para isso ). Mas já viu O Atalante? É absurdamente hipnótico para mim.

  2. Daniel Dalpizzolo

    Pretendo conferir em breve também. Grandes esperanças.

  3. Thiago Macêdo

    texto muito foda, Dan!

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